Thursday, June 29, 2006

Os inimigos do povo


José Dirceu,
ex -ministro-chefe da Casa Civil

[29/JUN/2006]

Quem acompanhou a via sacra dos programas sociais do governo Lula, particularmente do Bolsa Família, sabe que a oposição e grande parte da mídia apostaram no seu fracasso. No início, foi um coro só: "Os petistas e o governo Lula são incompetentes, não sabem administrar programas sociais". Agora que o Bolsa Família está implantado em todo o país e dá acesso a uma renda mínima para 11,1 milhões de famílias – que antes viviam abaixo da linha de pobreza – e é reconhecido pelas Nações Unidas, tentam virar o disco com outros argumentos.

"O Programa é eleitoreiro e aumenta o gasto público", dispara a oposição. Não bastasse, sai, agora, com a seguinte pérola: "o Bolsa Família pode ser o responsável pelo não crescimento do país". Os críticos chegam a chamar o Programa de bolsa esmola para concluir, numa análise simplista do quadro eleitoral, que o voto popular está sendo comprado pelo governo. Só isso – imaginam – explicaria a rejeição popular à coalizão tucano-pefelista e o apoio ao presidente Lula. Nega-se, às camadas populares, qualquer traço de consciência crítica que as leve a discernir os aliados, das elites que só sabem agir em benefício próprio.

Escapa, a essa elite, que o apoio ao presidente Lula é fruto, primeiro, de sua própria liderança, construída ao longo dos últimos trinta anos; e, segundo, da força de seu partido, o PT, o preferido dos eleitores segundo as pesquisas. O que a oposição e certa imprensa não podem admitir é que, no governo, o mesmo Lula criou 5 milhões de empregos formais em quatro anos; hoje, 99% das crianças brasileiras fazem três refeições ao dia e; vivemos no Brasil menos desigual dos últimos 46 anos.

Segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas, com base em dados da PNAD, a renda per capita dos pobres, em 2004, subiu 14%, enquanto a renda média da população cresceu 3,6%. Sob a administração Lula, a inflação brasileira foi reduzida a 4,5%, as pensões subiram, o salário mínimo aumentou e compra, hoje, duas cestas básicas, em comparação a pouco mais de uma, comprada em 2002.

Se erram o alvo com os primeiros tiros, nossos críticos disparam outra bateria, acusando o governo de populismo cambial. Será? Hoje, o Brasil tem superávit em contas correntes, reduzimos em 1/3 a dívida externa e saímos do FMI. Pagamos a dívida no Clube de Paris e retiramos de circulação títulos como os Bradies e os C- Bonds .

Se na frente externa o quadro é positivo, no mercado doméstico a pregação tucano-pefelista da volta ao passado não ecoa nas periferias. O preço do saco de cimento caiu para R$ 9, e o número de construções populares multiplica-se por todo o país. Para não perder o bordão, nossos críticos alegam que o Bolsa Família não inclui as condicionalidades prescritas pelo Banco Mundial, principalmente as que se referem a matrícula e presença na escola. Por aí também não dá mais, uma vez que, hoje, 90% das escolas brasileiras monitoram a presença das crianças beneficiadas pelo Programa, contra menos de 20% no governo anterior (com o Bolsa Escola).

No desespero, a oposição chega ao ponto de detectar um derradeiro risco nesse processo: "O crescimento de renda "à chinesa", com políticas compensatórias, ameaçaria as contas públicas". Menos, Senhores: todo mundo sabe que a verdadeira ameaça ao país é a dívida interna, que dobrou em relação ao PIB, nos oito anos de mandato de FHC. Quem ainda restringe a aceleração do crescimento são os juros pagos, que consomem 8% do PIB, enquanto o custo do Bolsa Família, por exemplo, é inferior a 0,5% do PIB. Num segundo mandato, é imperioso vencer as restrições do rentismo, reduzindo os juros.

A verdade nua e crua é essa: naquilo que a elite só enxerga "esmolão", o que emerge é um novo modelo de desenvolvimento com distribuição de renda. A redução das desigualdades, entre 2002 e 2005, e a notada melhoria da qualidade de vida dos mais pobres, como constata a pesquisa da FGV, reafirmam a convicção de que não há desenvolvimento sem distribuição de renda. O verdadeiro air-bag para proteger o país da volatilidade mundial não é o retorno à ortodoxia regressiva e antipovo e, sim, a construção de um amplo mercado interno de massas.

É evidente que o nosso principal problema não são os gastos nos programas sociais, mas a cegueira sectária daqueles que não se conformam com os avanços do governo Lula.

Sunday, June 25, 2006

Jingle da campanha Lula


Lula de novo

Não adianta tentarem me calar
Nunca ninguém vai abafar a minha voz
Quando o povo quer, ninguém domina

O mundo se ilumina, nós por ele e ele por nós
O mundo se ilumina, nós por ele e ele por nós

O Brasil quer seguir em frente
Com o primeiro homem do povo presidente
Ele sabe governar com o coração
E governa pra todos com justiça e união
É o primeiro presidente que tem a alma do povo
Que tem a cara da gente

São milhões de Lulas povoando este Brasil
Homens e mulheres noite e dia a lutar

Por um país justo e independente
Onde o presidente é povo
E o povo é presidente

Por um país justo e independente
Onde o presidente é povo
E o povo é presidente

Nós estamos aqui de novo...

[Coro]: Cantando!

Um sonho novo...

[Coro]: Pra sonhar!

Nós estamos aqui de novo...

[Coro]: Lutando!

A esperança não se cansa...

[Coro]: De gritar:

[Coro]: É Lula de novo, com a força do povo!
[Coro]: É Lula de novo, com a força do povo!
[Coro]: É Lula de novo, com a força do povo!
[Coro]: É Lula de novo, com a força do povo!

Saturday, June 24, 2006

Lula lança candidatura e Delcídio é vaiado pela militância petista

O Presidente Lula lançou hoje a sua candidatura à reeleição, em Convenção do PT no Minas Tênis Clube em Brasília e foi aclamado por cerca de 4,5 mil militantes. Entre os presentes, estavam parlamentares do PT, prefeitos e governadores.
Mostrando mais uma vez a união do partido contra as forças do atraso, que quiseram a todo o custo impedir a reeleição do nosso presidente, a militância entoou o jingle da campanha e não poupou o senador Delcídio Amaral que foi vaiado pela multidão que lotou o Minas Tênis Clube.
Foi uma demonstração de repúdio a esse indivíduo que usurpou a nossa legenda para eleger-se senador e comportou-se como um verdadeiro Judas na condução da CPI dos Correios, atuando como algóz dos nossos companheiros, que perseguidos pela mídia viram-se envolvidos nos escandâ-los plantados pela tucanalha.
É isso aí. Parabéns militância! E que ele fique sabendo que não esqueceremos!

Friday, June 23, 2006

O que realmente está em jogo em 2006?


José Dirceu,
ex -ministro-chefe da Casa Civil
JORNAL DO BRASIL
[22/JUN/2006]

Quando terminar a Copa do Mundo, outro jogo ocupará o campo principal das atenções nacionais e nele, estará em disputa aquilo que os próprios tucanos, finalmente, já admitem: a escolha entre dois projetos distintos de desenvolvimento para o Brasil do século XXI. Não há mais dúvida de que o governo Lula não foi uma continuidade do governo FHC e representa uma mudança, pois iniciou um novo ciclo econômico, diferente do modelo neoliberal dos anos 90.

Todavia, agora que já se admite a existência de uma alternativa em andamento, os críticos, da oposição, questionam nossa capacidade de sustentá-la, face ao ajuste da economia mundial, que pode ter começado com o aumento da taxa de juros nos EUA.

Na verdade, é paradoxal que, diante da incerteza, se defenda um retrocesso ao neoliberalismo tucano, quando se sabe que o principal obstáculo ao desenvolvimento brasileiro decorre, justamente, da herança fernandista. Tanto o desequilíbrio macroeconômico quanto a subordinação ideológica do Estado a esquematismos escravizantes – como o é a orientação rentista imposta à política monetária — são gargalos com denominação e origem consagradas.

O primeiro governo do presidente Lula retomou o controle da inflação. Mas, diferentemente da estagnação que caracterizou o ciclo tucano, promoveu, simultaneamente, a retomada do crescimento, com a criação média de 1,2 milhão de empregos por ano. Ademais, fez uma ruptura benigna na área externa, trocando a subordinação aos guichês do FMI e ao governo dos EUA por uma inserção comercial competitiva e soberana no mercado mundial.
Ganhamos, assim, um colchão de reservas quatro vezes superior ao disponível na era FHC. Bancos públicos e governo federal voltaram a investir nas áreas de energia, petróleo, ferrovias, portos, agricultura familiar, habitação, saneamento e turismo. A natureza do desenvolvimento mudou com a emergência de um mercado de massas, apoiado na expansão do emprego, da renda e do crédito ao consumo.

Os responsáveis pelo descalabro tucano, que agora propõem uma volta ao passado, esquecem-se da situação em que deixaram o Brasil. O que herdamos, em 2003, foi o rescaldo desastroso de uma crise energética, que custou – preços atuais – R$ 50 bilhões em prejuízos a toda sociedade.

O custo do déficit em conta corrente, depois de oito anos de estrangulamento externo, foi de 188 bilhões de dólares. Isso, sem falar na desagregação social cujas conseqüências o Brasil ainda enfrenta, apesar dos cinco milhões de empregos criados no governo Lula e do aumento com os gastos sociais. Todavia, o governo Lula manteve uma política monetária e, por conseqüência, um câmbio que inibem o crescimento e paralisam a nova política industrial e de inovação, impondo limites ao desenvolvimento do país.

A questão é se vamos retornar ao passado ou vamos avançar na agenda iniciada pelo atual governo. Vamos aumentar os investimentos públicos, com redução dos juros e um câmbio de exportação, fazendo como todos os países, inclusive os EUA, ou vamos aceitar a agenda do passado, que sempre exige corte nos gastos sociais, mais superávit, diminuição da participação dos salários na renda nacional, privatizações e mais abertura comercial, via Alca?

Não estamos fadados a um processo de esgotamento do atual ciclo, como sugerem os críticos tucanos, ao propalar que ele se apóia no aumento dos gastos públicos e da carga tributária, numa política de juros altos e câmbio valorizado que estrangulará nossa política exportadora e o impulso inovador de nossa economia.

A questão decisiva, agora, portanto, é armar o segundo tempo do jogo, para completar de vez a travessia para um modelo de desenvolvimento, lastreado em quatro motores: mercado interno de massa, apoiado em um amplo programa de distribuição de renda; revolução educacional; política de exportações agressiva e integração sul-americana que adicione respostas continentais aos impasses econômicos gerados pela volatilidade mundial. Mas não é possível construir esse modelo de desenvolvimento sem uma ampla reforma política e administrativa e sem o aumento dos investimentos públicos em infra-estrutura de transportes e urbana.

Não se pode mais responder com hesitação ao projeto regressivo embutido na análise tucana. É necessário fixar metas com audácia e criar os instrumentos de consenso político para alcançá-las. A um Conselho Monetário Nacional ampliado e democratizado caberia articular metas de inflação e de crescimento industrial, com criação de dois milhões de empregos por ano e não mais 1,2 milhão de empregos, como já fizemos no primeiro mandato.

Vivemos um momento de transição de um modelo para outro. Se chegamos até aqui, a duras penas, não é agora que iremos recuar ou andar em círculos. Pagamos caro pela memória trazida dos anos 90, já não mais inflacionária, mas ortodoxa, de juros altos e câmbio valorizado. Aprendemos com os erros e acumulamos experiência preciosa para construir, num segundo mandato, um projeto de desenvolvimento à altura do nosso povo e do tamanho do Brasil.

Friday, June 16, 2006

Entrevista: José Dirceu: "Não falei em off e paguei caro por isso"



Por Pedro Venceslau e
Rodrigo Manzano, de São Paulo

De novo, um militante

José Dirceu saiu do Planalto, mas o Planalto não saiu de Dirceu. Engana-se quem pensa que sua cassação na Câmara dos Deputados, depois de amargar dias em que o PT se viu como protagonista de uma crise política motivada pelas denúncias do ex-deputado Roberto Jefferson, e sua inelegibilidade por oito anos, reduziram a política do político. Era julho, o começo da crise. Em dezembro, ele caiu.

A figura de José Dirceu – sobre quem já pesavam várias acusações, entre elas a de ser centralizador e arrogante – ganhou as manchetes como o operador do suposto mensalão. Resistiu até o último momento e foi cassado. Mesmo depois da sua cassação, continuou sendo pauta. O rei morto, nesse caso, não era o rei posto, como prega um velho ditado português. E quanto mais a mídia dele falava, menos ele falava com a mídia. Abriu algumas exceções. Falou onde suas palavras ecoariam e seu discurso ainda teria alguma credibilidade, ou seja, nos veículos mais alinhados à esquerda. Ao que chama de mídia conservadora, nenhuma palavra. Ou poucas. Esperam-nas alguns processos, já em andamento, que José Dirceu move contra as revistas Veja e Istoé Dinheiro.

O José Dirceu que encontramos, não é o ex-ministro-chefe da Casa Civil, homem forte do governo petista. Mas também não é mais, nem menos. É, ainda, um homem público. Uma liderança escutada no Partido dos Trabalhadores. E, também, um político que nutre desafetos no seu rastro. Os jornais tornam públicas as várias manifestações hostis, seja em universidades, seja nos aeroportos, que recebe de eleitores. Dirceu se queixa, com o sotaque carregado e uma calma evidente, que se altera apenas quando perguntado sobre o papel que as redações tiveram na crise política. E foi sobre isso que falou à IMPRENSA. Não tem pudores em afirmar que as redações fazem o trabalho da elite conservadora. Que querem derrubar Lula. Mas assume, também, que agiu errado com a mídia e que o governo subestimou o papel dos meios de comunicação.

Sua agenda, hoje, resume-se a retomar as atividades como advogado. Não perde as oportunidades de dizer que, se em algum momento esteve em missão do PT ou do governo, hoje está em função de seus clientes. E de sustentar um discurso em defesa do governo Lula, do PT e de si mesmo. Tem lido alguns livros para aprender com a história. Procura nas biografias o que lhe explique algo que viu de tão perto: o poder. Leu a vida de Lott. Os diários de Getúlio Vargas. A biografia de Jango. Conforma-se com um dado histórico: "A mídia toda pediu o golpe de 64". Golpe, aliás, que lhe deu visibilidade política, como militante de esquerda e liderança estudantil. E agora, nos dias em que o homem forte dá lugar novamente a um militante, com discurso engajado e alguma indignação, o que lhe resta é ele mesmo e quem o apóia no partido. E quanto a ele mesmo, no dia da entrevista, queixava-se de uma virose que o fez passar mal durante um final de semana. Nem a imprensa, nem os micróbios, pouparam José Dirceu.
"A mídia de São Paulo elegeu Serra prefeito antes da eleição"

IMPRENSA – Qual foi o maior erro seu e do governo em relação à imprensa?

José Dirceu – Um dos grandes erros que nós cometemos foi subestimar o papel da mídia conservadora no governo Lula e no processo político brasileiro. A mídia sempre tomou partido.

IMPRENSA – Em nome de quem essa mídia conservadora está discursando?

Dirceu – A mídia discursa em nome da volta dos tucanos para o governo, em nome da aliança PFL-PSDB. Ela é anti-PT. Tomou partido dentro do governo e das disputas internas partidárias. Quando o PT era um partido que não fazia aliança, era criticado pela imprensa por isso. Depois, quando começou a construir um programa mínimo, construíram a imagem que o partido se descaracterizou, que ficou igual ao PSDB. Agora, durante esse processo todo, a mídia apoiou as facções dentro do PT que aceitavam a leitura da direita sobre a crise. Se você olhar o noticiário, vai perceber: todo mundo que se opôs a mim, que queria me tirar da chapa do campo majoritário (na eleição interna do PT), que queria me expulsar, foi apoiado pela imprensa. Diziam que era eu que estava derrotando o Tarso Genro, que eu estava articulando, sendo que eu estava afastado. Se você olhar como se comportou o jornal O Globo dentro da luta interna...eles tomaram partido. Basta observar como a mídia promoveu o PSOL...

IMPRENSA – Quando você fala em mídia está se referindo exatamente a quem? Eles agem em bloco?

Dirceu - Em alguns momentos eles se articulam e estabelecem uma agenda e uma pauta comum. Se você lesse, durante a crise, os quatro grandes jornais do país, via que eles tinham o mesmo conteúdo. Só que eles não assumem suas posições abertamente, em editorial...

IMPRENSA – Nem a Veja?

Dirceu – A Veja, em petit comité, assume que apoiou o Serra em 2002. Eles fizeram campanha. Às vezes, fazendo bravata, eles assumem isso. A mídia de São Paulo, em geral, elegeu o Serra prefeito antes da eleição. Ele nem precisou fazer campanha. Eles desconstruíram o governo da Marta, que foi o melhor que a cidade já teve. A mídia, inclusive a Folha de S.Paulo, que é serrista, desmontou a gestão Marta.

IMPRENSA – O maior inimigo do governo nas bancas é a Veja?

Dirceu – A Veja está desmoralizada, apesar de ter criado um eleitorado próprio, uma base social, que é de direita. A Abril associou-se à Nasper (grupo empresarial sul-africano), que é a direita dos neoconservadores. A notícia, hoje, em geral, aparece totalmente editorializada. Veja o "Bom Dia Brasil", por exemplo. Podia chamar "Nossa Opinião Brasil". Eles dão opinião o tempo todo. Não tem notícia. Não ouvem o outro lado. Fica lá o Renato Machado, dando opinião...Me assusta essa tendência de haver só um lado de opinião nos jornais.

IMPRENSA – E o Diogo Mainardi...

Dirceu – Ele é o pistoleiro da Veja. Geralmente, os donos dos meios de comunicação contratam pistoleiros para matar a honra das pessoas. E pagam bem para isso. Aquilo que o manual de redação proíbe, é feito pelo pistoleiro ou por um "Painel" de notinhas. Diogo Mainardi não tem credibilidade nenhuma.

IMPRENSA – Como você avalia a saída do Franklin Martins da Globo?

Dirceu – Fiquei estarrecido. Não sei exatamente o que aconteceu, mas ele tinha uma opinião divergente, ou pelo menos plural. Isso pode significar uma tendência de um certo macartismo na imprensa. As notícias que nós temos é que houve muita pressão nas reações contra os jornalistas que não estavam na corrente geral para derrubar o PT e o governo Lula.

IMPRENSA – Você mantém alguma estrutura fixa de comunicação para responder a todas as reportagens?

Dirceu – Eu tive, até janeiro, uma assessoria de imprensa. Leio todo dia cedo uns quatro clippings de jornais. Também dou uma olhada na Internet de manhã. Agora, estou contratando uma empresa de assessoria de imprensa. Parei de dar entrevistas...

IMPRENSA – A demanda ainda é muito alta?

Dirceu – Tenho uma demanda represada de praticamente todos os jornais e revistas. Mas parei de dar entrevistas. A minha principal meta é a reeleição do Lula.
"Diogo Mainardi é o pistoleiro da Veja"

IMPRENSA – Quantos processos vocês está movendo contra a imprensa?

Dirceu – Contra o irmão do Celso Daniel e outro contra a Veja.

IMPRENSA – E contra a IstoÉ Dinheiro, que fez aquela matéria sobre a moto Harley Davidson que você teria comprado?

Dirceu – Vou processar também. Eles procuraram meus advogados oferecendo um acordo, de fazer uma entrevista onde ficaria claro que a matéria não correspondia aos fatos. Mas não vou fazer acordo. Vou processar a revista e o jornalista. Não dá mais...Essa matéria, por exemplo, das contas no exterior, feita pela Veja. É uma matéria covarde, que faz um habeas corpus preventivo. Ela mesma diz, a mando dos advogados, para escapar de um processo, que a matéria não é verdadeira. A imprensa em geral desceu um nível do tempo que a imprensa apoiava a OBAN e o DOI-CODI.

IMPRENSA – A mídia ainda tem um certo fetiche com você...

Dirceu – Tem essa história que a Folha divulgou, de que eu fui vaiado no aeroporto. Eles demoraram 10 dias para publicar minha carta. O "Painel" da Folha afirmou que eu pedi para ir para a sala VIP da Varig, como se eu estivesse me escondendo. Em primeiro lugar, eu tenho direito à sala VIP, porque sou cliente diamante. Em segundo lugar, nunca viajei para o México pela Varig. Em terceiro, nunca fui vaiado. No caso do Genoíno, publicaram que ele foi vaiado no restaurante Famiglia Mancini. Só que ele não vai lá há anos. Eles não estão publicando notícia, estão mobilizando a base social deles para nos vaiar e nos hostilizar nos locais públicos, como se estivéssemos sendo condenados pela sociedade. É evidente que tem uma parcela que me condena. Tenho consciência da imagem negativa que tenho junto a uma parte importante da sociedade. Mas tem muita gente que me apóia. A oposição que existe a mim é maior do que a que existe ao Lula e ao governo, até pelo papel que eu joguei. É uma acusação improcedente, mas foi feita. Ninguém sabe dizer porque fui cassado. Enfim, o fato é que nunca fui hostilizado em local público.

IMPRENSA – E aquela palestra na PUC?

Dirceu - Isso é natural. Qualquer político do PT que for lá defender o Lula vai ser hostilizado. A maioria do pessoal era tucano ou do PSOL e PSTU. Eles começaram com "vai tomar no cu"...Isso foi mais o pessoal do PSOL. Começaram a jogar papel. É uma disputa política. Parte da mídia mobiliza sua base social contra nós.

IMPRENSA – Quais os veículos estão mais engajados nesta mobilização?

Dirceu – Os mais engajados são o Estadão, a Veja e O Globo, que trabalhou abertamente para me depor e, depois, pela minha cassação. A Folha vai e vem. Os processos contra mim são kafkianos.

IMPRENSA – Jornalistas de Brasília costumam dizer que você, quando era ministro, era muito arrogante com os jornalistas.

Dirceu - Minha relação com a imprensa era pautada pelo meu cargo e por minhas relações com o presidente. Isso limitava meu off , por exemplo. Não falei em off e paguei caro por isso. Em on, eu falava. Só que a imprensa está viciada na troca de informação, na intriga e na disputa interna. Eu nunca fiz isso. Errei porque devia ter construído uma relação de passar mais informações para a imprensa sobre os assuntos que estavam na Casa Civil. Eu devia ter organizado de outra maneira minha assessoria. Mas mesmo que tivesse organizado...Hoje existe um comportamento muito vil em alguns setores da imprensa. Se você não dá off, eles começam a falar mal, a te atacar. Se você se recusa a uma entrevista, vem represália. Começam a aparecer charges, te dão apelido, fazem notinha.

Leia matéria completa na edição 213 de IMPRENSA

O Brasil e a energia no século XXI


José Dirceu,
ex -ministro-chefe da Casa Civil
Jornal do Brasil

[15/JUN/2006]

Chegou a hora do Brasil. Temos tudo para enfrentar e superar a atual crise energética que vive o mundo. Uma crise não apenas do preço e do custo do petróleo e derivados, mas da segurança de sua produção e de seu abastecimento.
O aumento dos preços é histórico. Às razões de interesse nacional e do fim da superexploração dos países produtores, pelas grandes potências, somam-se razões econômicas: o aumento da demanda nas economias desenvolvidas e a entrada de dois novos gigantes – China e Índia – grandes consumidores, mas pobres em fontes de energia. Além disso, a guerra e a intervenção norte-americana reduziram a produção do Iraque a menos de 20% do que produzia no início da década de 80.

Na verdade, vivemos uma estagnação da produção mundial de petróleo na casa dos oitenta milhões de barris. As maiores reservas estão em zonas em guerra, como o Iraque, ou com conflitos políticos latentes, como Venezuela, Nigéria e Irã, ou em regiões com grande potencial de crises, como Arábia Saudita e Rússia e suas ex-repúblicas petroleiras. A Europa, a Argentina, o Chile, o Japão são, todos, dependentes do abastecimento externo e, portanto, de decisões políticas dos governos detentores da produção de petróleo.

A busca de opções ao petróleo também é pressionada pela crescente consciência ecológica dos riscos que corre a Terra, com a incontrolável emissão de poluentes. A não-assinatura do Tratado de Kioto, pelos Estados Unidos, expressa a gravidade da situação ambiental no mundo e coloca, na ordem do dia, a urgência das fontes alternativas de energia.
Surge, portanto, uma oportunidade histórica para o Brasil, maior produtor mundial de etanol com 17,8 bilhões de litros em 2006, e a caminho de ser, também, o maior produtor mundial de biodiesel, a partir de óleos vegetais. Se ampliarmos a área plantada de cana-de-açúcar, dos atuais 6,2 milhões de hectares para nove milhões, a produção de etanol poderá ser acrescida de mais 21,3 bilhões de litros, o que significa o Brasil exportar nove vezes mais do que os 2,4 bilhões de litros de hoje. Poderá, ainda, vender tecnologia e equipamentos para outros países produtores de açúcar e álcool, garantindo uma fonte segura e barata de energia para o mundo.

Para se ter uma idéia da importância do etanol, o governo norte-americano acaba de tomar a decisão de reduzir a tarifa protecionista sobre nossas exportações e estuda a possibilidade de misturar, na gasolina, 25% daquele biocombustível.

Esse cenário mostra que o governo Lula acertou ao transformar o biodiesel, junto com o etanol, em uma questão estratégica para o país, definindo uma política de Estado, sob a direção pessoal do presidente da República.
Se o Brasil quiser abastecer, também, o mercado internacional, precisa cuidar não apenas da produção e do refino dos biocombustíveis, mas de sua comercialização, evitando que monopólios internacionais controlem essa fonte energética do futuro. Trata-se do interesse nacional e de nossa segurança energética.
Mas o biocombustível tem, ou poderá ter, uma outra face – seu papel social – se não cometermos os mesmos erros do Pró-Álcool. Podemos e devemos apoiar parte da produção – e mesmo do esmagamento e do refino – na agricultura familiar e no cooperativismo e, assim, unir o papel econômico do biodiesel ao seu papel social, realizando uma grande e profunda mudança no campo brasileiro, principalmente no Nordeste.

Thursday, June 15, 2006

Presidente Lula no lançamento da pedra fundamental do pólo petroquímico de Itaboraí-RJ



Fotos do Presidente Lula no lançamento da pedra fundamental do pólo petroquímico de Itaboraí-RJ. A cerimônia contou com a presença do presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, de representantes do BNDES e do Grupo Ultra. O pólo será inaugurado em 2012.

Foram colocados documentos na caixa que foi enterrada na fazenda Macacu, em Itaboraí e que será aberta no ano de 2012 na inauguração do pólo.

Ao fundo podem ser vistas as ruínas do Convento de São Boa Ventura, construção do século XVII,tombada pelo IPHAN.



Fotos: Ricardo Stuckert/PR

Tuesday, June 13, 2006

A dor e os pássaros de Benedetti

Encontrei na minha caixa de e-mail esta linda e triste mensagem enviada pelo nosso amigo Adauto Melo, do Grupo Beatrice. Mensagem do nosso também querido Emir Sader sobre este escritor maravilhoso que é o Mário Benedetti. Dono de uma sensibilidade extraordinária, com certeza o Mário é um dos meus preferidos, seus escritos, mesmo que carreguem melancolia sempre nos trazem uma mensagem de esperança.
Tenho tido pouco tempo para estar aqui com vocês, peço desculpas aos meus amigos se já não me faço presente com tanta freqüencia, mas a vida às vezes deixa poucas alternativas.
Voltarei.
E agora não posso deixar de compartilhar com vocês essa maravilha de poema que só o Mário poderia escrever.
Bel

"Passei momentos muito duros". Assim escritor uruguaio Mario Benedetti conta a um amigo da morte da sua mulher e inseparável companheira, Luz. Ele também anuncia seu novo livro – Canções de quem não canta –, do qual nos envia um poema, chamado “Pássaros”.
Emir Sader
“(...) passei momentos muito duros. O mais doloroso foi que há duas semanas faleceu Luz, minha mulher, depois de dois anos de padecer a muito cruel mal de Alzheimer. Depois de 60 anos de um casamento feliz, isto significou um golpe muito duro.”Assim o escritor uruguaio Mario Benedetti conta a um amigo da morte da sua mulher e inseparável companheira, Luz. Ele anuncia também seu novo livro – Canções de quem não canta –, do qual nos envia um poema, chamado “Pássaros”:
“Os pássaros nos olham do alto
reconhecendo-se em nossos olhares
sabem de nossa compreensível inveja
e nos dedicam um poço de lástima.
Os pássaros compreendem os daqui de baixo
alegram os jardins/as areias
e se descem até nossa sombra
levam em suas asas a tristeza.
Os pássaros se escondem quando chove
e a árvore os recebe com carinho
e quando um raio lhes sacode o ar
tremem das asas até o bico.
Os pássaros se assomam a este mundo
o sobrevoam mas nunca em vão
acho que se há mais vidas e voltamos
por uma vez eu queria ser pássaro.”

Emir Sader é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e autor, entre outros, de “A vingança da História".

Sunday, June 11, 2006

O imperador Magá




Antonio Carlos Peixoto Magalhães, também conhecido pela alcunha de Toninho Malvadeza, ou simplesmente ACM, é um velho senador da família pefelista. Há alguns anos, o poderoso chefão baiano vem enganando o satanás, pois sua alma foi penhorada por dívida a Lúcifer, que lhe concedeu o título e poderes de "capo dei capi" (chefe de todos os chefes) das máfias brasileiras, com prazo de validade vencido no final do período da ditadura militar que vigorou no Brasil a partir de 1964 e prorrogado por tempo indeterminado. Numa das tentativas de cobrar sua dívida, Lúcifer submeteu ACM a um infarto, porém ele foi operado e recebeu o implante de duas pontes de safena e duas mamárias. O Príncipe das Trevas mandou apedrejar seus rins, contudo o velho foi operado em Londres, quando lhe retiraram três cálculos renais. Os capetas responsáveis por doenças do sistema respiratório andaram atanazando-lhe, porém o velho ACM pediu a Belzebu para permanecer na Terra até preparar seu sucessor. O demônio-chefe gostou da idéia e até indicou-lhe um dos seus netos para a escola de formação de diabos encarnados.

Por orientação do Reino dos Céus, quando Deus ainda exercia alguma influência sobre ACM, este se formou médico; porém, ao estabelecer o pacto com o Reino das Trevas, abandonou a profissão para assumir funções mais apropriadas aos desígnios de Satã: em 1954 elegeu-se deputado estadual pela UDN, marcando o início de uma das mais tenebrosas carreiras de golpista do Brasil, quiçá do mundo. Dez anos depois, na condição de deputado federal, apoiou o golpe militar que implantou uma sanguinária ditadura no País. Os ditadores de plantão reinstalaram o sistema de capitanias hereditárias no Brasil, e foi assim que ACM, como não poderia deixar de ser, apropriou-se de uma das sesmarias mais cobiçadas do Nordeste: hoje, a mundialmente conhecida Bahia de Antonio Carlos Magalhães, que também atende pelo título de imperador Magá, o malvado.

Apesar do título monárquico, ACM governa seu território à maneira de um coronel latifundiário, símbolo do autoritarismo e impunidade em terras tupiniquins, na modalidade coronel eletrônico, como são conhecidos os políticos donos de emissoras de rádio e tevê. O seu patrimônio é dos mais expressivos da Bahia. Em maio de 2000, o poderoso chefão baiano fez uma declaração parcial de seus bens à revista Valor Econômico:

"Eu tenho o governador, os três senadores, 95% dos prefeitos e 30 dos 39 deputados federais". E ainda desafiou: "Me mostre alguém que tenha um poder como este onde faz política" .

O imperador Magá, o malvado, em cinco décadas de atuação política, sempre se manteve constante no cenário político nacional. Aliando-se a quem ocupasse o poder central, manteve-se entre os déspotas do regime militar ou ao lado do entreguista Fernando Henrique Cardoso, um dos maiores vendilhões da pátria. Sobre este, num momento de pequeno desentendimento em relação a uma partilha, ACM declarou:

"O presidente permite a corrupção porque sempre foi leniente com ela e nunca tomou providências. Ele prefere ter uma base aliada mais forte, com corruptos, do que uma base menor, com gente séria. Pode escrever porque estou falando para ser publicado: Fernando Henrique é um homem falso" , jornal O Estado de S.Paulo, 23/02/01.

E falou com a autoridade de quem manteve uma relação íntima como FHC, pois, sobre sua amizade com este, ele, em 20/04/00, havia dito: "Só não fizemos sexo".

ACM foi nomeado prefeito biônico de Salvador e por duas vezes governador biônico do seu Estado. Também se distraiu um tempo como presidente da Eletrobrás, no entanto o que deve ter-lhe causado maior satisfação foi o cargo de ministro no governo Sarney. Durante a sua gestão no Ministério das Comunicações, o imperador Magá distribuiu várias concessões de rádio e TV em troca de apoio aos interesses do governo, em especial para a aprovação do mandato de cinco anos para seu presidente.

Na última terça-feira, dia 6, após a baderna que os militantes do MLST (Movimento de Libertação dos Sem-Terra) fizeram, invadindo as dependências da Câmara Federal, o imperador Magá, o malvado, usou a tribuna do Senado e convocou as Forças Armadas para deflagrar um golpe fatal contra governo Luiz Inácio Lula da Silva. Com a volta da ditadura militar, ACM tem como convencer o Príncipe das Trevas a lhe conceder mais um longo período na Terra, na condição de demônio encarnado.

Este foi o seu apelo:

"Eu pergunto: as Forças Armadas do Brasil, onde é que estão agora? Foi uma circular do presidente Castelo Branco, em março de 64, mostrando que o presidente da República não poderia dominar o povo sem respeitar a Constituição, que deu margem ao movimento de 64. As Forças Armadas não podem ficar caladas. Esses comandantes estão aí a obedecer a quem? A um subversivo? Quero dizer, neste instante, aos comandantes militares, não ao ministro da Defesa porque ele não defende coisa nenhuma: reajam enquanto é tempo. Antes que o Brasil caia na desgraça de uma ditadura sindical presidida pelo homem mais corrupto que já chegou à Presidência da República".

Dizem que o pedido de socorro do imperador Magá, o malvado, está sendo analisado por militares ligados às forças de Belzebu.

Mas... E Deus?! Por onde anda Deus nessas horas?!

Não é de todo correto afirmar, mas também não se pode negar a possibilidade de ser verdadeira a informação de que Deus, neste momento, está muito ocupado com as súplicas da torcida brasileira na Alemanha.


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Fernando Soares Campos
Rio, 10/06/2006

Thursday, June 08, 2006

TV digital: o que precisa entrar na pauta

José Dirceu
ex-ministro-chefe da Casa Civil

JORNAL DO BRASIL

[08/JUN/2006]

É, no mínimo, estranho que ainda não tenha sido incluída, na pauta oficial da TV digital, a discussão de como aproveitar a mudança de tecnologia para fortalecer um sistema público de TV, para ampliar os canais de distribuição de conteúdos de produção alternativa, comunitária e universitária; para permitir a entrada de novos agentes, até mesmo comerciais. Ou seja, a discussão de como aproveitar a mudança para democratizar o sistema brasileiro de televisão, dando a oportunidade de acesso, aos canais digitais de TV, à diversidade de produção cultural e informativa que existe no país.

Até agora, a discussão da TV digital tem-se concentrado nos aspectos tecnológicos, industriais e comerciais, questões extremamente importantes, porque não há desenvolvimento sem inovação tecnológica. Nesse ponto, o governo Lula inovou ao abandonar o eixo de condução adotado no governo FHC – concentrado na escolha do padrão tecnológico entre os três estrangeiros existentes – e criar o Sistema Brasileiro de TV Digital, que produziu um importante resultado: financiou desenvolvimentos de 22 consórcios de pesquisa, que já resultaram em produtos prontos para serem incorporados ao padrão tecnológico a ser escolhido. A escolha do padrão pôde, por isso, ser conduzida em outro patamar: com os desenvolvimentos nacionais de módulos do sistema de TV digital, o governo ganhou musculatura para exigir participação brasileira no comitê de definição das evoluções do padrão estrangeiro a ser adotado e, também, para assegurar a incorporação, a ele, de tecnologias nacionais.

A criação de um ambiente industrial para os diversos componentes da TV digital também é fundamental para o Brasil, que não pode ficar na condição de mero consumidor, nem de mero produtor para o mercado interno. Mas, para não ser só uma plataforma de exportação de equipamentos montados, precisa desenvolver uma indústria de microeletrônica ou, pelo menos, parte de sua cadeia, passando necessariamente pelo desenho de projetos de chips, onde está a concepção dos produtos. Os contornos dessa política industrial da TV digital ainda não estão completos, fato que indica que acelerar decisões não é o melhor caminho, no momento atual.

Mas, na pauta da TV digital, faltam outras questões tão relevantes quanto essas: o governo Lula precisa retomar a discussão de princípios e objetivos contidos no decreto que criou o SBDTV, como o marco regulatório que vai amparar o modelo de TV digital no país e dar a ele viabilidade, e o modelo de negócios, que vai definir o papel dos diferentes agentes – como integrar as diferentes redes; como permitir o acesso, aos diferentes produtores de conteúdo, à transmissão digital; como criar condições de se usar a interatividade da TV digital para inclusão social, em especial na oferta de serviços públicos para a população.

Essas discussões têm que envolver, de forma concreta e abrangente, a sociedade civil. Também não basta o governo editar o decreto definindo as características do padrão de TV digital e delegar, ao Congresso Nacional, a elaboração do marco regulatório e do modelo de negócios.

É inegável a importância da participação do Congresso Nacional no debate, uma vez que àquela instância caberá discutir e aprovar uma nova Lei Eletrônica de Comunicação de Massa, mais do que nunca necessária ante a convergência das tecnologias que, como um arrastão, vêm derrubando as concepções tradicionais de serviços de telecomunicações e comunicações.

Mas, se o governo tem autoridade para definir o padrão tecnológico, tem, também, autoridade – e o dever – de definir a contrapartida que os radiodifusores comerciais darão à sociedade brasileira ao receberem, sem ônus, mais 6 MHz de espectro, que é um bem público e finito.

Durante a transição da TV analógica para a digital, que consumirá entre dez e 15 anos, cada uma das emissoras comerciais ocupará 12 MHz de faixas de freqüência. Elas receberão isso de graça? Ou o governo, ao lhes conceder um bem, que é público, lhes exigirá contrapartidas para a sociedade como, por exemplo, a abertura, na fase de transição, de um canal na transmissão standard (sem alta definição) à programação de terceiros e a contribuição obrigatória para um fundo de financiamento do sistema público de TV?
O governo não pode mais adiar esse debate.

José Dirceu escreve às quintas-feiras no JB.

Friday, June 02, 2006

Aprender com a crise



José Dirceu,
ex -ministro-chefe da Casa Civil

JORNAL DO BRASIL

01/JUN/2006
Nada como uma crise para revelar a natureza não apenas das coisas, mas, principalmente, dos homens. Como reagiram as diferentes forças políticas e sociais às turbulências esperadas – e inevitáveis – da economia mundial? E as nossas lideranças políticas e empresariais?

A oposição fingiu que nada aconteceu, envolvida que estava com a crise entre tucanos e pefelistas , em torno da candidatura Alckmin. E alienada na sua pretensa cruzada ética – que, evidentemente, passa ao largo do caso dos "sanguessugas" e da "quadrilha de Itaipu", onde há parlamentares seus envolvidos.

Do lado do governo, nada de novo, além das inevitáveis garantias de que a economia não sairá dos trilhos, mais uma vez repetidas com ênfase pelo presidente da República e por seus ministros. Como sempre, o Tesouro e o BC tomaram as medidas necessárias para dar todas – todas mesmo – garantias aos investidores. Nenhuma discussão ou proposta de como enfrentar essa inevitável nova fase da economia mundial. Só ruídos do passado e a volta ao discurso neoliberal, de mais ajuste fiscal e mais cortes nas despesas de pessoal e nos chamados "privilégios trabalhistas".

Felizmente, vozes autorizadas e experientes – como as de Rubens Ricúpero, Delfim Neto e Jorge Gerdau – manifestaram-se, sinalizando, ao país, que já é hora de mudar, que nada continuará como antes no mundo; que os Estados Unidos não têm condições de manter tamanho déficit fiscal e comercial; e que não há como a China e outros países continuarem com suas moedas artificialmente desvalorizadas.

Ficou evidente o tamanho do risco que nosso Brasil corre ao manter sua principal commodity, o Real, tão valorizada com juros tão altos. Ou seja, os dois preços mais importantes da economia contribuem para aumentar o risco Brasil e a vulnerabilidade de nossa economia. Não apenas porque nos tiram a competitividade onde temos vantagens comparativas extraordinárias – no agro negócio e na indústria exportadora – como podem desestruturar vários setores industriais exportadores, a exemplo de calçados, têxtil e confecções, entre outros.

Todos sabem que nosso superávit comercial e nas contas correntes é, em grande parte, conseqüência do baixo crescimento econômico dos últimos anos, que resulta em fraca expansão das importações e, portanto, em superávit artificial a longo prazo. A chave da questão está em superar, a curto prazo, essa armadilha – juros altos e câmbio valorizado – que inviabiliza um crescimento equilibrado de nossas exportações e do nosso mercado interno. Caso contrário, ela terminará por arruinar, de novo, nossa economia.

A redução dos juros não resolveria apenas a valorização cambial, mas permitiria que o Brasil iniciasse um aumento substancial da poupança nacional, hoje na casa dos 20% do PIB, com um crescimento, em média, de 2,5% ao ano. E com uma política clara voltada ao aumento da poupança pública, o país terá condições de crescer a taxas de 5% ao ano.

Reorientar nossa economia, com a redução dos juros e da meta de superávit fiscal, não significa deixar de lado o rigor fiscal ou a luta contra a inflação, mas fazê-los dentro de uma política nacional de desenvolvimento, a partir das bases criadas no primeiro governo do presidente Lula.

O país precisa de uma meta de crescimento e de poupança nacional. Para alcançá-la, são necessários investimentos na infra-estrutura e um vasto programa social nas doze regiões metropolitanas do Brasil, consolidando a nova política de habitação, saneamento, transporte de massa, educação e a luta contra a pobreza iniciada por Lula.

Não dá mais para perder tempo com um modelo econômico neoliberal que não responde às necessidades do país e de seus cidadãos. A trinca social que ameaça o Estado brasileiro, que divide nossa sociedade em dois mundos – o dos que têm acesso a bens e serviços sociais e o dos que não têm acesso aos direitos básicos da cidadania – e que está jogando nossos jovens das periferias das grandes cidades nos braços do crime organizado, não permite mais vacilações nem conciliações.

É hora de ter coragem para tomar as medidas necessárias para promover o desenvolvimento nacional com distribuição de renda e combate à pobreza. O que só é possível com a ação do Estado, renovado e reformado, a serviço do povo brasileiro.

José Dirceu escreve às quintas-feiras no JB.