Friday, September 08, 2006

A pauta do desenvolvimento

José Dirceu

(Artigo publicado no Jornal do Brasil, em 07 de setembro de 2006)

A questão do desenvolvimento, mesmo com um viés crítico com relação ao governo Lula, vai tomando conta do debate, pelo menos na imprensa escrita. Isso é um bom sinal, porque ajuda o Brasil. O país não pode mais ficar patinando, com um desempenho para lá de modesto em relação aos demais países emergentes. Não há porque não crescer a uma taxa de 5%, 6% ao ano, a partir de 2007.

As condições macroeconômicas estão dadas. O país resolveu sua situação externa, tanto em termos de equação da dívida como da balança de pagamentos, embora, do ponto de vista da política cambial, o quadro não seja confortável. Ainda temos que resolver a questão da dívida pública interna, que vem gradativamente melhorando de qualidade, ou seja, seus prazos vêm sendo alongados. Já há condições de acelerar a redução dos juros, como o demonstrou o Copom em sua última reunião.

Ou seja, o presidente Lula, se reeleito como indicam as pesquisas, vai iniciar seu segundo mandato em condições muito diferentes e extremamente vantajosas em relação a 2003. Será preciso agarrar essa oportunidade para fazer o país crescer e estabelecer uma política desenvolvimentista, que exige a construção de consensos em torno dos objetivos que forem definidos.
Para isso, além da redução mais acelerada dos juros, é preciso que o Banco Central enfrente a questão da apreciação do real, que vem inviabilizando a competitividade de importantes e eficientes cadeias produtivas. Isso tem se refletido na redução dos investimentos e, se o processo não for contido, pode levar rapidamente à desestruturação dessas cadeias, a exemplo do que ocorreu em outros momentos da história recente do país. Vários economistas têm chamado a atenção para o fato de que a decisão de ser, ou não, conivente com a apreciação prolongada da taxa de câmbio será decisiva, nos próximos anos, para a economia brasileira.

Com a ação nessas duas frentes, somada à melhoria da qualidade da dívida interna e da redução da dívida externa, o país estará pronto para começar a sua arrancada de desenvolvimento, onde o investimento público tem papel relevante – é ele que alavanca o investimento privado.
Estariam dadas as condições, creio, de aumentar os investimentos públicos que precisam chegar a 1,75% do PIB já, e a 3%, numa segunda fase. Se isso for feito, teremos, junto com os investimentos da Petrobras e das estatais, 5% de investimento público. O que permitirá investir pesado em educação e inovação.

É evidente que precisamos, também, resolver gargalos como do Judiciário e da burocracia ineficientes, nosso contencioso ambiental sem solução, impostos irracionais, deficiências na infra-estrutura de transportes, questões legais e regulatórias que impedem parcerias e concessões.

As propostas de cortar gastos sociais são inviáveis, a não ser que queiramos transformar o Brasil num grande PCC. A Previdência precisa de ser modernizada e o crescimento econômico pode trazer seu déficit, de R$ 40 bilhões (2% do PIB) para R$ 20 bilhões. Fora disso, é jogar o país em uma agenda negativa que discute os "privilégios" dos de baixo e não toca nos dos de cima.

Não se pode continuar pagando R$ 150 bilhões de juros, dos quais 70% vão para 13 mil empresas e famílias e 30%, para 7 milhões de poupadores. E, ao mesmo tempo, exigir que não se aumente os salários e pensões da imensa maioria do povo brasileiro, que depende desse rendimento para não cair na miséria. A idéia de que reduzir gastos com salários dos servidores públicos, pensionistas e trabalhadores que ganham o mínimo libera recursos para investimento é uma ilusão. O Brasil não tem futuro com a renda do trabalho equivalente a 36% da renda nacional, quando, nos países que se desenvolveram, ela equivale a, no mínimo, 50%.

Só o crescimento econômico, apoiado num crescente mercado interno de massas, com distribuição de renda – que tem de ser uma obsessão – nos salva. Saídas fáceis já tentamos no passado; elas acabaram em milagres econômicos que arruinaram o país e quase nos roubaram a soberania.

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