CARTAS NA MESA
A apologia do golpe
Há um movimento golpista incitado por aqueles que dizem abertamente estarem cansados do governo Lula. Os mesmos setores que blindaram o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, enquanto ele servia aos seus fins, são hoje seus principais algozes.
Nelson Breve
1) O que nos espanta e estarrece é que os chefes das nossas Forças Armadas não se tenham convencido até agora de que não é um governo isso que aí está, e que é faltar com o respeito que eles devem ao país o recusarem-se a agir, enquanto é tempo, com a altivez e a visão das coisas brasileiras que demonstraram em outubro de 45 e em agosto de 54. (A catástrofe em que vamos soçobrando – 8/10/1963.)
2) É preciso que o Legislativo comece a dizer basta. Melhor seria então que, para isso, simplesmente ignorasse a decisão de Jobim e fizesse a oitiva de Francenildo Costa na CPI dos Bingos. Com certeza, assim agindo o Legislativo deixará claro que na representação legitima que faz da sociedade brasileira ínsita não está a submissão subserviente e humilhante a outros Poderes. (A Hora de o Congresso dizer basta! – 22/03/2006.)
Um intervalo de 42 anos separa a publicação destes dois editoriais. O que há de comum entre eles é que ambos foram publicados pelo mesmo jornal. O que mais há de comum entre eles? Defendem abertamente a ruptura da ordem institucional. O primeiro alcançou o objetivo de instar as Forças Armadas a derrubarem o governo do presidente João Goulart. O segundo incita a maioria oposicionista do Senado a se insurgir contra uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que busca resguardar os limites de uma investigação parlamentar estabelecidos pela Constituição Federal.
É a apologia do golpe contra o Estado de Direito, que só tem valor, na opinião de parte significante da imprensa brasileira, quando resguarda apenas um dos lados da disputa política. Há um movimento golpista incitado por aqueles que dizem abertamente estarem cansados do governo Lula. Como não há um ambiente propício para um golpe militar, hoje, no Brasil, os golpistas enrustidos partem para a incitação de outras instituições. Não se importam com a violação dos preceitos democráticos, desde que o objetivo final seja desmoralizar um governo que se recusa a governar do jeito que eles querem.
Os mesmos setores que blindaram o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, enquanto ele servia aos seus fins, são hoje seus principais algozes. O mesmo jornal dos editorias acima proibia, há dois anos, que seus repórteres escrevessem que a política econômica era contestada internamente no governo. A palavra de ministros de Estado era considerada insuficiente para contestar o ministro da Fazenda. Hoje, ele é apontado como mentiroso com base na palavra de gente do povo, que pode ou não estar sendo manipulada por interesses espúrios.
Vamos partir do princípio de que o caseiro esteja dizendo a verdade. Qual é o crime cometido pelo ministro Palocci? Ter freqüentado uma casa difamada? Não ter falado a verdade? O que isso tem a ver com o interesse público? Se o ministro é suspeito de ter desviado recursos públicos ou tomado decisões contrárias aos interesses nacionais ou aos princípios da moralidade na administração pública, que coloquem na mesa as acusações. Criam um escândalo a partir de uma contradição, para justificar uma investigação ilegal, inconstitucional e imoral. Mistificam o caso para dar um ar de gravidade que ele não teria se ocorresse em um governo do PFL ou do PSDB. Desprezam as linhas de investigação que não servem para sangrar o governo.
Mas o governo também tem sua culpa. Foi incompetente em todas as áreas, especialmente na condução política e na comunicação. Silenciou quando a CPI dos Bingos saiu do foco para o qual foi criada. Não operou com empenho para assegurar maioria na Comissão. Não montou um esquadrão de crise para enfrentar a batalha da comunicação, combatendo a tropa organizada pela oposição. Com isso deixou prevalecer na mídia versões incorretas em prejuízo do governo ou de seus aliados.
A questão da quebra do sigilo, por exemplo. É falso dizer que o sigilo foi quebrado quando alguém da CAIXA levantou um extrato da movimentação bancária de Francenildo Santos Costa. Qualquer funcionário minimamente graduado da CAIXA tem permissão para obter essa informação. Informações desse tipo são levantadas aos milhares, todos os dias, por questão de segurança ou de estratégia de negócios. Não só na CAIXA, em qualquer banco.
Os extratos podem transitar por toda uma linha hierárquica, sem que tenha ocorrido crime algum. A violação só se dá quando a movimentação bancária é revelada para alguém de fora da instituição. Esse deve ser o ponto de partida de qualquer investigação séria e isenta. Primeiro: quem entregou o extrato para alguém de fora da instituição? Segundo: por ordem de quem? O resto é perda de tempo e desinformação.
Aparentemente, o folhetim do caseiro é mais uma dessas pantomimas concebidas no cruzamento da canalhice com a estupidez. No intuito de proteger o chefe de uma ofensiva criminosa, o guarda-costas comete um crime grave, que ganha proporções dantescas porque um dos lados está estrategicamente amparado pela cavalaria da mídia. O filme é conhecido. Já provocou o suicídio de um presidente, aqui, a renúncia de outros, em democracias mais perenes, e muitas fatalidades pelo mundo afora.
A oposição pode levar a cabeça de Palocci desse jeito. Os golpistas inveterados podem conseguir derrubar o governo Lula, ou desgastá-lo impiedosamente para chegar desmoralizado na disputa eleitoral. A cavalaria pode cortar muitas cabeças pelo caminho. Mas os bons soldados sabem que não há honra nesse tipo de vitória.
Nelson Breve foi repórter das rádios Eldorado e CBN, da Agência Estado e do Jornal do Brasil, e assessor de imprensa da Confederação Nacional da Indústria e do ex-deputado José Dirceu. Retorna à Carta Maior para atuar como repórter especial na Sucursal de Brasília.
Há um movimento golpista incitado por aqueles que dizem abertamente estarem cansados do governo Lula. Os mesmos setores que blindaram o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, enquanto ele servia aos seus fins, são hoje seus principais algozes.
Nelson Breve
1) O que nos espanta e estarrece é que os chefes das nossas Forças Armadas não se tenham convencido até agora de que não é um governo isso que aí está, e que é faltar com o respeito que eles devem ao país o recusarem-se a agir, enquanto é tempo, com a altivez e a visão das coisas brasileiras que demonstraram em outubro de 45 e em agosto de 54. (A catástrofe em que vamos soçobrando – 8/10/1963.)
2) É preciso que o Legislativo comece a dizer basta. Melhor seria então que, para isso, simplesmente ignorasse a decisão de Jobim e fizesse a oitiva de Francenildo Costa na CPI dos Bingos. Com certeza, assim agindo o Legislativo deixará claro que na representação legitima que faz da sociedade brasileira ínsita não está a submissão subserviente e humilhante a outros Poderes. (A Hora de o Congresso dizer basta! – 22/03/2006.)
Um intervalo de 42 anos separa a publicação destes dois editoriais. O que há de comum entre eles é que ambos foram publicados pelo mesmo jornal. O que mais há de comum entre eles? Defendem abertamente a ruptura da ordem institucional. O primeiro alcançou o objetivo de instar as Forças Armadas a derrubarem o governo do presidente João Goulart. O segundo incita a maioria oposicionista do Senado a se insurgir contra uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que busca resguardar os limites de uma investigação parlamentar estabelecidos pela Constituição Federal.
É a apologia do golpe contra o Estado de Direito, que só tem valor, na opinião de parte significante da imprensa brasileira, quando resguarda apenas um dos lados da disputa política. Há um movimento golpista incitado por aqueles que dizem abertamente estarem cansados do governo Lula. Como não há um ambiente propício para um golpe militar, hoje, no Brasil, os golpistas enrustidos partem para a incitação de outras instituições. Não se importam com a violação dos preceitos democráticos, desde que o objetivo final seja desmoralizar um governo que se recusa a governar do jeito que eles querem.
Os mesmos setores que blindaram o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, enquanto ele servia aos seus fins, são hoje seus principais algozes. O mesmo jornal dos editorias acima proibia, há dois anos, que seus repórteres escrevessem que a política econômica era contestada internamente no governo. A palavra de ministros de Estado era considerada insuficiente para contestar o ministro da Fazenda. Hoje, ele é apontado como mentiroso com base na palavra de gente do povo, que pode ou não estar sendo manipulada por interesses espúrios.
Vamos partir do princípio de que o caseiro esteja dizendo a verdade. Qual é o crime cometido pelo ministro Palocci? Ter freqüentado uma casa difamada? Não ter falado a verdade? O que isso tem a ver com o interesse público? Se o ministro é suspeito de ter desviado recursos públicos ou tomado decisões contrárias aos interesses nacionais ou aos princípios da moralidade na administração pública, que coloquem na mesa as acusações. Criam um escândalo a partir de uma contradição, para justificar uma investigação ilegal, inconstitucional e imoral. Mistificam o caso para dar um ar de gravidade que ele não teria se ocorresse em um governo do PFL ou do PSDB. Desprezam as linhas de investigação que não servem para sangrar o governo.
Mas o governo também tem sua culpa. Foi incompetente em todas as áreas, especialmente na condução política e na comunicação. Silenciou quando a CPI dos Bingos saiu do foco para o qual foi criada. Não operou com empenho para assegurar maioria na Comissão. Não montou um esquadrão de crise para enfrentar a batalha da comunicação, combatendo a tropa organizada pela oposição. Com isso deixou prevalecer na mídia versões incorretas em prejuízo do governo ou de seus aliados.
A questão da quebra do sigilo, por exemplo. É falso dizer que o sigilo foi quebrado quando alguém da CAIXA levantou um extrato da movimentação bancária de Francenildo Santos Costa. Qualquer funcionário minimamente graduado da CAIXA tem permissão para obter essa informação. Informações desse tipo são levantadas aos milhares, todos os dias, por questão de segurança ou de estratégia de negócios. Não só na CAIXA, em qualquer banco.
Os extratos podem transitar por toda uma linha hierárquica, sem que tenha ocorrido crime algum. A violação só se dá quando a movimentação bancária é revelada para alguém de fora da instituição. Esse deve ser o ponto de partida de qualquer investigação séria e isenta. Primeiro: quem entregou o extrato para alguém de fora da instituição? Segundo: por ordem de quem? O resto é perda de tempo e desinformação.
Aparentemente, o folhetim do caseiro é mais uma dessas pantomimas concebidas no cruzamento da canalhice com a estupidez. No intuito de proteger o chefe de uma ofensiva criminosa, o guarda-costas comete um crime grave, que ganha proporções dantescas porque um dos lados está estrategicamente amparado pela cavalaria da mídia. O filme é conhecido. Já provocou o suicídio de um presidente, aqui, a renúncia de outros, em democracias mais perenes, e muitas fatalidades pelo mundo afora.
A oposição pode levar a cabeça de Palocci desse jeito. Os golpistas inveterados podem conseguir derrubar o governo Lula, ou desgastá-lo impiedosamente para chegar desmoralizado na disputa eleitoral. A cavalaria pode cortar muitas cabeças pelo caminho. Mas os bons soldados sabem que não há honra nesse tipo de vitória.
Nelson Breve foi repórter das rádios Eldorado e CBN, da Agência Estado e do Jornal do Brasil, e assessor de imprensa da Confederação Nacional da Indústria e do ex-deputado José Dirceu. Retorna à Carta Maior para atuar como repórter especial na Sucursal de Brasília.
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