Wednesday, March 29, 2006

Breve, muito breve, Nelson

Brasil

Fernando Soares CamposLa Insignia. Brasil, março de 2006.

"Há um movimento golpista incitado por aqueles que dizem abertamente estarem cansados do governo Lula. Como não há um ambiente propício para um golpe militar, hoje, no Brasil, os golpistas enrustidos [enrustidos?] partem para a incitação de outras instituições." Nelson Breve, em "A apologia do golpe", Agência Carta Maior (1).
Esta é, a meu ver, uma crença ingênua, a de que "... não há ambiente propício para um golpe militar, hoje, no Brasil".
Realmente, o incitamento, hoje, é para que o Congresso Nacional, principalmente o Senado, ou confiando acima de tudo nesta instituição, concretize o golpe; porém, no caso de este vir a se consumar, as Força Armadas seriam convocadas (e elas já se colocaram à disposição) para agir de imediato (urgente!) contra "o narcotráfico", "o contrabando de armas" e "o crime organizado em geral", em operações urbanas.
Hoje (27/03) assisti, através da TV Senado, ao senador Magno Malta (PL-ES) elogiando a atuação do Exército no enfrentamento ao tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Dizia ele que a operação cerca-boca, a da busca das armas roubadas de um quartel em São Cristóvão, foi realizada de forma tão perfeita que, durante as manobras, até mesmo o número de bala perdida diminuiu (acho que o senador "assistiu" ao último episódio de Bonnie & Clyde of Goitacaz's Fields), e ele acredita ainda que a governadora Rosinha Garotinho e seu marido "governadoro" apoiariam uma nova ação dessa natureza, disponibilizando reforço policial, pelo bem do povo e felicidade geral da Nação. O senador chegou a sugerir que se evacue cerca de 200 famílias em cada favela, assentando-as em local seguro, e que em seus lugares sejam instaladas as tropas que promoveriam a paz nas favelas. Aleluia, irmão!
Entenderam? Ou, como diria Pelé, entende?
Pois bem, para quem ainda não entendeu, eu explico o que entendi: desta vez as Forças Armadas não estariam a serviço de um golpe de Estado, entende? A ação seria em benefício da "segurança pública", entende? Com as Forças Armadas combatendo "o narcotráfico", "o contrabando de armas" e desenvolvendo outras ações voltadas para a "segurança do cidadão", em operações urbanas, entende? A população em geral, "satisfeita" (vimos, há pouco tempo, em duas semanas de enquete em todos os jornais do Rio, 93% da população apoiando a intervenção militar, entende?), pois bem, a população "satisfeita", refém da violência urbana, certamente apoiaria o combate a possíveis revoltas de "petistas baderneiros", que insistissem em pedir a volta do presidente, entende? Provavelmente, o Exército também combateria as ações "violentas" dos sem-terra, como as que foram mostradas hoje (27/03) no Jornal Nacional, na tela da Globo, entende?! Alguns sem-terra saqueando caminhões, mais laboratórios depredados por sem-terra (informou o âncora), e a polícia assistindo a tudo, "impassível", "impotente", numa estrada, em Alagoas. Onde nasci, me criei e sei que um tiro para o alto faria todo mundo ali correr léguas, entende? Mas os policiais apenas assistiam. E, nas salas de estar, botequins, recepções, ante-salas e onde mais se costuma manter um televisor ligado na Globo, muita gente deve ter gritado : "Só o Exército pode restaurar a ordem!", entende? Pois bem, depois de tudo isso, quem você acha que durante toda a semana será chamado de fraco? Para os que assim pensam, ser forte é ser truculento, é agir como no Estado do Pará, em 17 de abril de 1996, quando 19 trabalhadores rurais foram fuzilados, o que ficou conhecido como massacre de Eldorado dos Carajás.
Não duvido que, a qualquer momento, entrevistem alguns generais e os consultem sobre as possibilidades de um iminente golpe de Estado. Eu já vi coisas assim: repórteres perguntando a generais se existia algum golpe em andamento. Como se algum conspirador admitisse as intenções de golpear. Não estou com isso dizendo que algum general conspira, atualmente, no Brasil, refiro-me à "ingenuidade" de certos profissionais de imprensa.
Conspiração contra um governo (qualquer que seja) é uma constante, é uma atitude comum a oposições. Golpear um governo não depende apenas de "clima" ou "ambiente"; mas, acima de tudo, de oportunidade. E essa oportunidade a oposição brasileira está criando, com o apoio da mídia golpista, pois quem sabe faz a hora, não espera acontecer. Lembram-se? Quer dizer, entende? Os tempos são outros, os métodos talvez também sejam outros, mais sutis, porém não menos violentos.
Milhares de pessoas já morreram porque não acreditavam em golpe militar iminente. Duvido que, na manhã de 31 de março de 64, os militantes de esquerda e a população brasileira em geral acreditassem que, naquele mesmo dia, os tanques estariam nas ruas.
Eu perguntaria aos companheiros chilenos se eles poderiam nos relatar como se sentiam no dia em que bombardearam o La Moneda e eliminaram o presidente Salvador Allende. Se haviam sido notificados sobre o "evento". Se os companheiros argentinos, por acaso, receberam algum boletim informativo com uma nota do tipo "Amanhã cedo vamos golpear". Como foi o primeiro dia de matança aí na Argentina, hein? Como estava o clima naquele dia? Muito frio? Chuvoso? Nevasca? Calor?
Agora, aterrissando novamente em terras tupiniquins, vejamos alguns trechos do que escreveu o capitão-de-mar-e-guerra Cláudio Buchholz Ferreira, no Manifesto dos Companheiros das Forças Armadas, em outubro de 2005:
"Em um momento da vida nacional em que o povo mais precisa das Forças Armadas para o restabelecimento da ordem e da garantia das Instituições, fiquem certos de que elas não se acovardarão ante o processo de desvalorização dos seus integrantes e da premeditada ação de anulação de sua capacidade de reação e de cumprimento do seu dever, nem em face de tentativas de implantação de regimes totalitários, contrários às nossas mais sagradas tradições." (...) Não temos permissão para nos acomodar. Por juramento, somos obrigados a tomar uma atitude. Chega de chantagens emocionais "quartelada", "golpe", "patrulhamento". (...) Fazemos votos para que aqueles que, em dissonância com a história, ainda pretendem implantar no Brasil um estado totalitário, desistam da idéia, porque não é isso que os brasileiros querem e se eles não querem nós não vamos deixar que isso aconteça. O que todos querem é muito simples: imprensa livre, repetindo, IMPRENSA LIVRE..." (Para ler o texto completo, use o link 2)
Imprensa livre, entende? Como se liberdade de imprensa conferisse o direito à mentira, ao engodo, às meias-verdades, às acusações precipitadas, sem que o acusado tenha direito a defesa. O AI-5 do general Costa e Silva, em 68, impôs o fechamento do Congresso Nacional; no entanto, nos dias de hoje, com a imprensa e o Congresso que temos aí, nem precisa cassar mandatos, nem precisa impor censura à imprensa. Pra quê?! Eles já aprenderam a autocensurar-se, a obedecer, a mancomunar-se. Nada de atos de exceção, hoje basta o que já temos aí: impérios jornalísticos a serviço do poder econômico, engasgados com um presidente de origem paupérrima, de pouca instrução formal, mas competente, ensinando como se governa um país. Isto, para as oligarquias que dominaram este país durante séculos, é inaceitável. Não adianta multiplicarem seus lucros, o importante para elas será a retomada do poder institucional. Imaginem quantas madames estão torcendo o nariz para a primeira dama, quanta cobrança fazem aos seus maridos, instigando-lhes o ódio e a cobiça. Quanta inveja! Imagine de quanta covardia serão capazes, para novamente se apossarem do trono.
Com o clima existente, hoje, aqui no Brasil, vendo aqueles senadores cuspir, a gente tem a certeza do ódio, da conspiração. Hoje (27/03), quando o senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), na Tribuna do Senado, aos berros, acusava o atual governo de ter inventado a corrupção, o homem lançou placas de cuspe e babou abundantemente ao pronunciar o nome do presidente Luiz Inácio Lula das Silva. Assim sendo, para nos protegermos, para não sermos surpreendidos, a gente precisa acreditar em golpe, completo, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Breve, muito breve, Nelson.

Nelson Breve foi repórter das rádios Eldorado e CBN, da Agência Estado e do Jornal do Brasil, e assessor de imprensa da Confederação Nacional da Indústria e do ex-deputado José Dirceu. Retorna à Carta Maior para atuar como repórter especial na Sucursal de Brasília.

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